30 EXCLUSIVO: Manuel Abendroth explora novas linguagens com o coletivo LAb[au] na Dan Galeria

EXCLUSIVO: Manuel Abendroth explora novas linguagens com o coletivo LAb[au] na Dan Galeria

Arte

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O LAb[au], coletivo belga fundado por Manuel Abendroth e Jérôme Decock, explora o potencial de novas linguagens na exposição "Writing, painting, calculating, transcoding". A mostra marca a primeira individual do grupo no Brasil, sediada na DAN Galeria Contemporânea, e sublinha a afinidade do espaço expositivo com o movimento concreto.

 

Em entrevista exclusiva à Numéro Brasil, Manuel Abendroth fala sobre a intersecção entre tecnologia e arte, o papel das práticas colaborativas e a importância da linguagem – seja em formas codificadas ou em semântica.

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Foto: Divulgação

Numéro Brasil: Qual é a conexão entre o trabalho do LAb[au] e a arte brasileira?

 

Manuel Abendroth: É uma história muito longa. Acredito que o nosso trabalho ressoa com a arte dos anos 60 do Brasil – arte conceitual, arte e poesia concreta, muito com a linguagem. É compreensível que nós, de alguma forma, sejamos de uma nova geração, mas que é muito baseada nisso.

 

Numéro Brasil: O nome LAb[au] é uma combinação de laboratório e construção, refletindo a intersecção entre pesquisa e arquitetura. Como essas duas formas influenciam a evolução do coletivo?

 

Manuel Abendroth: Nosso nome sempre gerou polêmica. Nós pensamos em 1996, e, na época, não havia internet – ou, digamos, que começamos a ter internet, e nós trabalhávamos muito antes dela. Hoje em dia, é um nome impactante, com colchetes, letras maiúsculas e minúsculas. É uma palavra.

 

Ainda gosto dele porque expressa muito bem os diferentes aspectos do nosso trabalho. O primeiro deles é um laboratório de arte e urbanismo – nós viemos de um ponto de vista arquitetural, onde nosso trabalho se relaciona muito com o pensamento arquitetônico. Viemos dessa área, e fazemos arte. Essa é uma primeira leitura muito boa.

 

Temos interesse em uma abordagem teórica: nós organizamos nossas próprias plataformas de exposições, escrevemos livros e textos teóricos. Somos tanto em teoria quanto em prática – e de novo, o nome diz isso.

 

E aí chegamos ao foco da coisa, onde tocamos na diferença entre a fonética e a escrita: algumas pessoas dizem “labô”, outras dizem “labau”. Então, é claro, brincar com a linguística, a língua, e quando há uma pequena alteração, muda o significado. Se você olhar para o nosso trabalho, é isso que fazemos: transformamos um sistema linguístico em outro. Trabalhamos com o semáforo, com a codificação binária, damos-lhe um giro e ele se torna algo diferente, muda.

 

Sempre nos interessamos em reivindicar a língua, reivindicar como expressar com as ferramentas do nosso tempo, e como elas alteram nosso jeito de fazer – também é um link que, de alguma forma, está no nome.

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Foto: Divulgação

Numéro Brasil: Vocês têm algum trabalho relacionado à moda?

 

Manuel Abendroth: Exploramos muitos, muitos campos. Já trabalhamos com Walter van Beirendonck. Então, sim, temos mostrado nosso trabalho no contexto de moda, e fizemos, até 2002, diversos trabalhos com estilistas.

 

Música é uma ferramenta que também desenvolvemos – acho que se você procura essa nova linguagem e como pensá-la, explora-se muitas coisas. O que acontece no nosso trabalho hoje é que podemos reduzir o que pensamos em "uma pintura que não é pintada com um pincel". De alguma forma, conseguimos trazer todo esse novo mundo para uma simples pintura. Mas precisamos explorar tudo isso para reinventar a pintura hoje. No nosso trabalho este método é muito sistemático, metodológico, e, além disso, somos um grupo. Nós dizemos que a maioria dos artistas são individuais.

 

Numéro Brasil: Como a prática colaborativa e a criação artística se complementam?

 

Manuel Abendroth: O laboratório para nós é mais como um label. Não é sobre eu como pessoa, Manuel, que é o importante: o laboratório é o pensamento. E se aproxima de como os arquitetos trabalham, porque é mais do que uma oficina, é uma colaboração. Só se pode fazer arquitetura como uma estrutura colaborativa. Claro que tudo pode ser feito digitalmente, mas se não tivermos um prédio, não há representação e não há onde ir, nós não podemos criar conhecimento somente na tela. Quando começamos, iniciamos com questões. E uma das primeiras perguntas foi: o que seria uma biblioteca no século XXI?

 

Numéro Brasil: É possível construir uma biblioteca do tempo?

 

Manuel Abendroth: Essas são coisas que, como artistas, estamos sempre voltando. Definitivamente, uma das nossas premissas básicas é que somos realmente artistas conceituais. O que nos faz conceituais é que o sentido do nosso trabalho é dar uma definição à arte.

 

Nós podemos refletir sobre o mundo, mas refletimos com o significado e o pensamento sobre a arte. Se você quiser pensar sobre o que poderia ser realmente uma definição sobre arte conceitual, é o artista, que o objetivo principal é pensar sobre o que a arte pode ser. Isso é o que é. E eu acho que estamos muito nessa tradição. Com isso, chega-se a coisas como as tautologias, que foram muito definidas, e também esse pensamento sobre coisas fundamentais, elementares, espaço, tempo, unidades.

 

Definitivamente essa ideia de como pensar o tempo é uma pergunta linda… Quando você reflete sobre o tempo, reflete também sobre você. Você pode definir o tempo, pode medir, mas o significado do tempo não está no medir. E isso é algo muito bonito, dá lugar para um artista interpretá-lo de forma sua, e não sendo científico. De novo, você tem a questão do tempo, mas em nosso trabalho mais recente, nós refletimos de uma forma muito própria.

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Foto: Divulgação

Numéro Brasil: Há uma intersecção clara entre a arte e a tecnologia no trabalho do LAb[au]. Como vocês balanceiam a tecnologia, tão estrita e rigorosa, com a liberdade criativa? Há um momento em que uma destas forças sobrepõe a outra?

 

Manuel Abendroth: Primeiro de tudo, eu diria que não somos científicos. Claro que usamos a ciência, mas não somos científicos – e não há potencial para sermos. E você saberá assim que nos colocarmos como cientistas, porque a finalidade e a metodologia são totalmente diferentes, não temos que fazer um trabalho doutorado sobre qualquer coisa. Podemos apenas levar isso como um jeito de refletir o mundo.

 

Em nosso trabalho recente não se vê mais a tecnologia, mesmo que seja super tecnológico. É baseado em computadores, AI, dados, mas não se vê isso – não é parte, não é mais visível. Acho que temos uma maneira muito consciente de trabalhar. Na verdade, é muito mais filosófico.

 

Talvez o que é realmente importante é a diferença entre muitos artistas que usam tecnologias atualmente: sabemos como codificar, nós mesmos desenvolvemos tudo, criamos softwares e sistemas. Realmente sabemos o que é, do ponto de vista tecnológico. Quando fazemos uma instalação, tudo, até mesmo a ferramenta, é feita em casa, porque queremos trabalhar com o material. E há um jeito de apropriá-lo – queremos conhecê-lo para nos livrar dele, ou para libertá-lo. É criativo, e permanece sendo.

 

Numéro Brasil: Por que Bruxelas como a cidade para se estabelecer?

 

Manuel Abendroth: Eu realmente gosto da mentalidade belga – a Bélgica sempre foi o país do pensamento livre. Por exemplo, você pergunta ao belga o que significa ser belga, ele olha para você e diz: "eu não entendo o que você está dizendo. O que é nacionalismo? Eu não sei." Porque eles não têm isso, eles são muito mente aberta.

 

Numéro Brasil: Existe uma grande cena de moda na Bélgica, como estilistas, artistas, fotógrafos… É uma escola muito importante.

 

Manuel Abendroth: Nós temos, por exemplo, 150 galerias de arte, 50 instituições, 50 espaços de coleção de arte, 50 espaços de artistas… Temos 20 feiras de arte. É muito, né?

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Fotos: Divulgação

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Numéro Brasil: É enorme. E você acha que essa experiência brasileira vai mudar algo em você?

 

Manuel Abendroth: Esta é a quarta vez que venho ao Brasil, mas ainda não coloquei os pés fora de São Paulo, embora saiba que o país é muito maior do que isso. Agora, pela primeira vez, estarei de férias aqui após a exposição, e finalmente sinto que poderei respirar.

 

Vejo o Brasil como um "irmão" da Europa em termos de modernismo. O que foi Le Corbusier para a Europa, Niemeyer é para o Brasil. A arte brasileira, especialmente a poesia e a arte concreta, tem uma forte conexão com movimentos europeus, como na Alemanha. Enquanto a Europa é mais conceitual, o Brasil tem uma abordagem diferente, mais integrada à natureza e à sociedade. O modernismo no Brasil parece estar mais presente no dia a dia, especialmente após os anos 50, com um papel significativo de Niemeyer, algo que não ocorreu da mesma forma na Europa. Hoje, sinto até que nosso trabalho possa ser mais bem compreendido aqui.

 

O Flávio, diretor de arte contemporânea da DAN Galeria, comentou que teríamos feito uma mostra assim antes, se não fosse pela pandemia. Mas agora parece ser o momento certo.

 

Numéro Brasil: Como é para a DAN Galeria trazer a primeira exposição individual do grupo LAb[au] para o Brasil?

 

Flávio Cohn: A galeria tem a missão de representar artistas concretos, então há uma afinidade com a linguagem que Manuel e o LAb[au] desenvolveram. E também para dar continuidade à história da galeria e mostrar como essa semente do concreto continua invocando novos trabalhos, novos artistas, novos idiomas.

 

Faz muito sentido expor LAB[au] no Brasil porque todos os artistas brasileiros que estão ligados a esse movimento, que também os influenciam, ou que estão ligados a ele, ou colecionadores que não conhecem o seu trabalho, deveriam ter a oportunidade de ver como isso é uma língua universal. Não é apenas alemão e francês, mas é uma língua nova, e como lidar com essas ferramentas para criar uma nova expressão.

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