“Espero expressar o maior número de emoções que conseguir”, reflete Marco Tomasetta, quando questionado sobre a jornada à frente da Montblanc. Nas mãos, ele segura uma peça de estimação. “Tenho este modelo de caneta desde 2003; chama-se Leonardo. Usei-a em todas as empresas de moda por onde passei, pois não crio em computador. Preciso aproveitar as ideias que vêm espontaneamente. Preciso desenhar”, conta o designer italiano, formado no Istituto Europeo di Design de Milão, com passagens pela área de acessórios em grifes como Louis Vuitton, Prada, Chloé e Givenchy.
Tomasetta assumiu o posto de diretor artístico da Montblanc em 2021, num movimento muito bem calculado para fazer com que as novas gerações desejem cada vez mais a logomarca de linhas sinuosas, que representa o topo nevado do Mont Blanc, nos Alpes – e faz reconhecer de longe a grife alemã. Para isso, os acessórios de couro, que são a expertise do designer, passaram a ser o foco do portfólio. Mas sem deixar de lado, é claro, as clássicas canetas, produzidas artesanalmente na fábrica em Hamburgo, na Alemanha, desde 1906 – algumas peças só ficam prontas depois de passar por mais de 30 etapas, todas manuais.
Foto: Mariano Vivanco
“A (caneta) Meisterstück transformou o modo de escrever. Não sou contra a vida online, mas aconselho aos jovens que se desconectem e vivenciem o real”, diz o diretor artístico.
Ao abrir espaço para abraçar clientes mais jovens, a Montblanc aproveita para honrar a sua heritage – um posicionamento que também ficou claro com a inauguração, no ano passado, do Montblanc Haus, museu majestoso dedicado à arte da escrita, na mesma Hamburgo. O couro entrou na mira da marca por volta de 1935 e, desde os anos 1980, as peças feitas com o material são produzidas em Florença, na Itália, a mais importante referência na manufatura de couro para o mercado de luxo. A maison bem sabe que as novas gerações mal escrevem à mão hoje, mas têm muito interesse em acessórios de moda, principalmente os de grife. Dessa forma, pelas mãos do designer passou a integrar o catálogo uma nova leva de mochilas, carteiras, bolsas e pastas. Com pegada contemporânea e formas precisas, em alguns casos até aerodinâmicas, as peças têm perfil menos formal, às vezes até esportivo, com texturas e em versões intercambiáveis e modulares. Espertamente, o italiano revê os códigos de luxo que vão além da velha ostentação de objetos, em busca do que esses itens são capazes de proporcionar no cotidiano. Ainda como estratégia para dialogar com novos públicos, a marca adequou a produção, garantindo que a matéria- prima seja curtida em processos neutros em emissão de CO2, e que o forro seja feito com fibras recicladas. Mas a herança sempre está presente: as texturas no couro remetem às criações de Grete Gross, designer da escola Bauhaus que cuidava da identidade visual da casa na década de 1920.
Passear entre a tradição e a modernidade parece ser a melhor definição da personalidade do designer. Além do fato de que ele ainda desenha à mão, Tomasetta conta que foi após um desses mergulhos nos arquivos da maison, em busca de novas inspirações, que decidiu adicionar cores à linha de acessórios. Na coleção lançada em junho em Paris, na França, verde, alaranjado, vinho, e azul ganharam passe livre.
Paralelamente à injeção de um estilo que evoca as viagens e o movimento frenético da vida moderna (para nômades digitais ou não), Tomasetta introduz a pausa e introspecção na atual campanha, criada pelo fotógrafo Mariano Vivanco e estrelada pela modelo Karen Elson e pelo ator James Norton. Eles estão em silêncio, na livraria, ou confortáveis, deitados em um sofá de couro, rodeados por suas leituras – e longe de redes sociais ou de qualquer tipo de gadget eletrônico. “O luxo de hoje é poder ter um momento privado, com diálogos sem interrupção”, comenta, ensaiando em seguida uma análise mais aprofundada sobre os tempos atuais. “Pense em um momento no campo, quando você pode se demorar na grama. Acho que sempre precisaremos disso. Durante a quarentena, eu escrevi muito. Escrever é a melhor maneira para entrar em si. Os jovens não podem ter medo de se conhecer internamente, mas o Instagram, por exemplo, é um obstáculo. Com essa velocidade toda, perde-se muito do que era natural para as gerações anteriores: a capacidade de entender as emoções”, pondera. “Quero mostrar que o luxo não tem ‘temporada’. Não é como a moda, dizendo o que é novo e o que é velho”, ensina, sugerindo que é possível mirar à frente enquanto se olha para trás.
Foto: G.F.