Na literatura, o termo “in media res” diz respeito a uma técnica que apresenta ao leitor a narrativa não do início, mas já em andamento. A sensação é a de ser lançado no meio de uma ação, como uma testemunha documental, muito embora numa obra de ficção. É possível dizer que existe nisso um paralelo com a obra de Helmut Newton.
O fotógrafo alemão criou um estilo de imagem que frequentemente provoca no espectador a impressão de estar penetrando em uma cena na qual não foi convidado a ver – seja pela audácia da composição, pela improvável direção –, mas que, ironicamente, é absolutamente convidativa. E que, sim, carrega um processo absolutamente intencional. Parece apropriado, então, que a nova exposição que joga luz sobre seu trabalho se chame “Helmut Newton – Fact & Fiction”.
Como diretor e curador da Helmut Newton Foundation em Berlim, Matthias Harder observou, ao longo de duas décadas, a extensa trajetória fotográfica do artista (incluindo uma examinação minuciosa de seus contact sheets). “Nenhum outro fotógrafo moldou nossa memória visual coletiva como ele”, conta em entrevista à Numéro Brasil. “Em 60 anos de carreira, Newton foi um mestre em quase todo gênero em que se propôs a atuar”. E não foram poucos.
Em cartaz n’A Coruña, na Espanha, até maio de 2024, a mostra percorre desde seus famosos “Big Nudes” até paisagens pouco conhecidas, com retratos de personalidades no meio, além de fotografias de moda que, notoriamente, seguem reverberando seu impacto nas novas gerações de image-makers.
“Eu entendo que os fotógrafos costumam ter uma reação à integridade do trabalho de Helmut”, diz Philippe Garner, um dos curadores da exposição. “Alguns pegam ideias específicas; pode ser na forma de uma homenagem e pode ser simplesmente uma cópia. Há quem diga que imitação é a forma mais sincera de lisonjeio. A maior lição que podemos ter de Helmut, no entanto, é a de levar confiança para sua própria visão”.